Uma homenagem a Ricardo Kotscho
Soube ontem pelo Comunique-se, que este jornalista admirável comemora 40 anos de profissão. Depois da longa jornada, Kotscho anuncia que vai deixar a Secretaria de Imprensa da Presidência da República e diz que seu maior objetivo é ter uma qualidade de vida melhor. Não pude deixar de lembrar da gentil entrevista que ele concedeu a um grupo de estudantes da Uniban em 2002, ano de campanha presidencial.
Imaginem-se estudantes de jornalismo. Este é ano de TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) e de campanha eleitoral para presidente. Seu projeto é uma revista interessada em gente comum, anônima, que não tem espaço na grande imprensa, mas com conteúdo, história pra contar e uma atitude nobre diante da vida. Não ocupam necessariamente posição de destaque na sociedade, nem realizam trabalhos voluntários. Simplesmente fizeram do cotidiano uma luta pelo bem-estar social. Pensando sobre a linha que o TCC deve seguir, você se lembra de um livro-reportagem, lido na faculdade mesmo, no primeiro ano talvez. O autor era Ricardo Kotscho. Você não lembra bem o título, mas não esqueceu a preocupação desse jornalista desde os seus tempos de foca. Em vez de apurar números, estatísticas e escrever com base nesses dados, ele os materializava em personagens reais. Se não tinha nada pra fazer na redação, pegava um fotógrafo que estivesse dando sopa, e iam pra rua, atrás de informações. Certa vez, Kotscho foi cobrir a visita do então presidente da República Castelo Branco ao Horto Florestal. Optou por deixar seus amigos mais experientes à espera do pronunciamento oficial (que não veio) e foi conversar com os freqüentadores do parque. Não só ouviu relatos maravilhosos, como conseguiu publicá-los ao lado da cobertura da "solenidade".
Eureca! O grande achado! A revista vai tratar de pessoas desconhecidas, mas alguém que justifique todo o projeto, por ser um modelo a ser seguido, não pode ficar de fora de jeito nenhum. É até candidato a capa. Decisão tomada, é hora de tentar falar com ele. Vale repetir aqui que esse é ano de eleição presidencial e Ricardo Kostcho nada mais é do que assessor de imprensa de um dos mais fortes candidatos, até então. Isso mesmo, Luiz Inácio Lula da Silva. Falar com o cara, pensamos, será quase impossível. Mas como a esperança vai muito bem de saúde, obrigada, e não vai morrer tão cedo, mãos a obra: munidos do telefone do comitê do partido, do nome e do email do assessor do assessor (não escrevi duas vezes por engano) do futuro presidente, uma descrição sucinta, mas detalhada do projeto foi preparada e send, lá se foi o email. Pronto. Missão cumprida por enquanto.
Papo vai, papo vem, três meses se passaram e a turma já estava pra lá de desencanada. Até que um belo dia, toca o telefone e eu estremeço do outro lado. "Oi Luciana, aqui é Ricardo Kotscho. Recebi seu email, achei muito bacana o projeto e faço questão de receber vocês. O problema é que como estou no corre-corre da campanha, só posso te atender amanhã. Você pode estar às 17h no comitê do partido?" Mas que pergunta, meu caro. Se você dissesse vem agora, de helicóptero, eu daria um jeito. Claro que não disse isso a ele, mas pensei.
Tudo certo. No dia seguinte, lá fomos nós: Roberta Sales, Paulinho Florêncio, Raffaele Sgueglia (fotógrafo da Fiesp, grande figura, que nunca trabalhou tanto de graça na vida dele pra um grupo de estudantes) e eu, felizes e contentes. Simpatia em pessoa, Ricardo Kotscho nos avisou que estava indo pro escritório nos Jardins. "Vocês podem ir pra lá?" Ah, que ótimo. Fizemos um tour pelo centro, com direito a ônibus lotado na Nove de Julho, ponto errado na hora de descer e uns quatro quilômetros de caminhada pra largar de ser besta.
É engraçado lembrar de todos esses detalhes dois anos depois, da meia-hora de conversa que Kotscho nos abriu na sua agenda atribulada e, principalmente, do resultado. Kotscho não foi capa, mas mereceu uma bela chamada, a matéria ficou linda, a revista, que se chama Singular, bárbara (graças às valiosíssimas contribuições dos designers Luiz Carlos de Moraes - graaaaande amigo - e Luciano Arnold) e a nota do TCC, máxima.
Agora, fico sabendo que Kotscho quer "uma qualidade de vida melhor". Essa afirmação me preocupa. Será preciso quarenta anos de trabalho diário e incansável pra tomar essa decisão?
Em tempo: Gleyson Santos, Bruna Mantovani e Lígia Nunes, eram os outros integrantes do grupo de TCC. No dia da entrevista com Kotscho, estavam em outra missão.
"Quero uma qualidade de vida melhor"
Miriam Abreu, do Comunique-se
"Trabalhei um ano durante a campanha presidencial e mais dois anos no governo. São três anos fora de casa. Daqui a pouco minha mulher vai me mandar embora e meu cachorro não vai me deixar entrar em casa". Ricardo Kotscho, secretário de Imprensa da Presidência, deixa o cargo no final de novembro. Em outubro, ele completou 40 anos de ofício e agora só pensa em descansar, voltar para a família, em São Paulo, e escrever um livro sobre as histórias ao longo desse tempo de jornalismo - o título deverá ser "Do golpe ao Planalto". "Quero uma qualidade de vida melhor". Ele também planeja voltar a fazer palestras remuneradas.
A permanência no governo por dois anos já tinha sido negociada com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Seu substituto, Fábio Kerche, atual secretário-adjunto de Imprensa, está preparado para assumir seu lugar, segundo o próprio Kotscho. "É uma pessoa em quem eu e o presidente confiamos".
Voltar a trabalhar em redações não faz mais parte dos planos do jornalista, embora ele prefira não dizer "nunca". "Da última vez que trabalhei na Folha (de S. Paulo) escrevi minha vigésima matéria sobre seca. Não há nada que lamento não ter feito nem nenhuma matéria que eu acho que não tenha escrito".
Nesta quarta-feira (10/11), Kotscho reúne amigos do governo e da profissão para um jantar, em Brasília, para comemorar os 40 anos de Jornalismo.
Um balanço dos dois anos no governoApesar de a secretaria de Imprensa e Divulgação mudar de comando a partir do próximo mês, a estrutura será mantida. Aliás, Kotscho se diz satisfeito com seu trabalho à frente da secretaria. A única novidade que ele não vai acompanhar de perto, embora já tenha deixado tudo engatilhado, é a reforma do comitê de imprensa do Palácio do Planalto. "A reforma é necessária porque as condições de trabalho no local não são boas. No dia 27/12, ela estará pronta".
Ele está ciente das reclamações de colegas quanto a entrevistas concedidas por Lula. "Todo mundo reclama, mas nunca um presidente deu tantas entrevistas quanto o Lula em dois anos. Como assessor, penso que quanto mais contato, melhor. Acho que fizemos o máximo nesse período". Para Kotscho, a experiência de trabalhar no governo federal foi "fascinante".
Outros dois pontos que marcaram a comunicação nesses dois anos de governo Lula não poderiam passar em branco. Um deles é o projeto de criação do Conselho Federal de Jornalismo, defendido por Kotscho em muitos artigos, nos quais ele estimula o debate sobre o assunto. "Sempre defendi o projeto. Fui diretor do sindicato, vice da Fenaj e membro da ABI. O pedido foi feito pela Fenaj ao Executivo e agora a decisão é do Congresso".
O caso Larry Rother também provocou polêmica. Kotscho lutou contra a decisão inicial do governo de cancelar o visto temporário do correspondente do New York Times. "No caso, fui minoria, mas lutei para a suspensão da decisão". Ele afirma que os boatos de que pediu demissão na época são inverídicos.
2 Comments:
Olá, Luciana, tudo bem?
Sou estudante de jornalismo da Unesp/Bauru e estou no último ano de graduação.
Escolhi como tema para meu TCC jornalismo investigativo, e como produto farei um livro-reportagem com uma coletânea de matérias investigativas de grandes jornalistas da área. Tenho a intenção de ter como um de meus entrevistados o jornalista Ricardo Kotscho, e gostaria de saber se você tem o e-mail dele, para que eu possa entrar em contato.
Desde já, agradeço sua atenção.
Abraços,
Tatiana Zanon
Olá, Tatiana,
Infelizmente, não tenho o email do Ricardo Kotscho. Na época do meu
TCC, meu contato com ele foi por intermédio do PT (do qual ele era assessor na campanha do Lula para presidente).
Acredito que consiga um telefone ou email nas editoras que publicaram seus últimos dois livros (Cia das Letras e Ediouro).
Agradeço o seu contato e desejo sorte no seu trabalho.
Abs.
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